
Chegou a hora de revisarmos um tema essencial: a hemostasia, mecanismo fundamental para conter sangramentos e restaurar a integridade vascular.
Com este resumo, te ajudamos a aprofundar o conhecimento e te prepara ainda mais para a prática clínica e para as provas. Vamos juntos?
Conceito de Hemostasia
A hemostasia é um processo fisiológico complexo que tem como função principal conter o sangramento após uma lesão vascular. Trata-se de uma resposta rápida, localizada e regulada, capaz de formar coágulos para interromper a perda de sangue e, ao mesmo tempo, promover a reparação dos tecidos danificados.
Esse mecanismo envolve duas vias interligadas:
-
Formação do coágulo de fibrina, mediada pela ação da trombina;
-
Degradação do coágulo, realizada pela plasmina.
A disfunção em qualquer etapa pode gerar quadros clínicos significativos, como hemorragias (por falhas na trombina ou fibrinogênio) ou tromboses (por produção excessiva de trombina).
Hemostasia Primária
Logo após uma lesão em um vaso sanguíneo, ocorre vasoconstrição reflexa, provocada pela lesão endotelial. Essa contração inicial ajuda a reduzir imediatamente o fluxo sanguíneo local.
A lesão do endotélio libera substâncias que ativam as plaquetas, promovendo a adesão plaquetária, mediada pelo colágeno exposto e pelo fator de von Willebrand, que facilitam a ligação das plaquetas à matriz subendotelial.
Uma vez aderidas, as plaquetas ativam seus mecanismos internos, liberando grânulos ricos em mediadores como:
-
ADP,
-
Serotonina,
-
Histamina,
-
Fosfolipídios plaquetários,
-
Tromboxano A₂.
Essas substâncias reforçam a agregação plaquetária, recrutando outras plaquetas para formar o tampão hemostático primário.
Hemostasia Secundária
A segunda fase da hemostasia consiste na ativação da cascata de coagulação, uma sequência de reações bioquímicas entre fatores plasmáticos numerados em algarismos romanos.
As reações ocorrem em três vias:
-
Via intrínseca: ativada pelo contato do sangue com superfícies anormais (ex: colágeno), iniciando com o fator XII, que ativa o XI, seguido pela ativação do IX. O fator IXa, junto com o fator VIII, ativa o fator X.
-
Via extrínseca: ativada pelo fator tecidual liberado na lesão, que em conjunto com o fator VII, cálcio e fosfolipídios, ativa o fator X.
-
Via comum: ambas as vias convergem aqui. O fator Xa, junto ao fator V e fosfolipídios, forma o complexo protrombinase, que converte a protrombina (fator II) em trombina. Esta, por sua vez, transforma o fibrinogênio (fator I) em fibrina, estabilizada posteriormente pelo fator XIII, com participação do cálcio.
A trombina, além de gerar fibrina, reforça a ativação plaquetária e estimula respostas inflamatórias, associando coagulação a processos sistêmicos como infecção, choque e inflamação.

Hemostasia Terciária
Após o coágulo cumprir seu papel, é essencial que ele seja removido para que a circulação local se normalize. Isso ocorre por meio da fibrinólise, responsável pela degradação da fibrina insolúvel.
A plasmina, enzima ativa responsável por essa degradação, é formada a partir do plasminogênio sob estímulo de ativadores específicos, como o t-PA e o u-PA, cuja ação é regulada pelo inibidor PAI-1.
Durante a fibrinólise:
-
O plasminogênio é ativado a plasmina.
-
A plasmina digere a fibrina em fragmentos menores, que são removidos do local pela ação do sistema retículo-endotelial.
A especificidade da plasmina pela fibrina evita que ocorra degradação sistêmica do coágulo, mantendo a regulação local.
Inibidores fisiológicos da fibrinólise:
-
PAI-1: bloqueia o t-PA e o u-PA.
-
PAI-2: função ainda não completamente conhecida.
-
α2-antiplasmina: inibe diretamente a plasmina.
-
TAFI: ativado por complexos trombina-trombomodulina, modula a fibrinólise.
O equilíbrio fibrinolítico é mantido por:
-
Ativadores locais,
-
Remoção hepática de ativadores,
-
Inibição direta da plasmina,
-
Ação de antiplasmina.
Exames Laboratoriais Relacionados à Hemostasia
Apesar das limitações em representar a hemostasia in vivo, os testes laboratoriais são fundamentais na investigação de distúrbios de coagulação.
Avaliação das Plaquetas
-
Número e função plaquetária: verifica contagem e morfologia.
-
Tempo de Sangramento (TS): avalia a formação do tampão plaquetário após incisão superficial.
Tempo de Protrombina (TP)
-
Avalia a via extrínseca: fatores I, II, V, VII e X.
-
Usa tromboplastina e cálcio.
-
Expressa em segundos e pelo RNI (útil em monitoramento de anticoagulantes orais).
Tempo de Tromboplastina Parcial Ativada (TTPA)
-
Avalia as vias intrínseca e comum: fatores XII, XI, IX, VIII, X, V, II e I.
-
Utiliza reagentes como caulim, cefalina e cálcio.
Tempo de Trombina (TT)
-
Mede a conversão de fibrinogênio em fibrina.
-
Detecta deficiências de fibrinogênio e presença de heparina.
Dosagem de Fibrinogênio
-
Essencial na investigação de CIVD e ativação fibrinolítica.
-
Aumenta em estados inflamatórios e na gestação.
-
Valor normal: 200–400 mg/dL.
De Olho na Prova
Esse tema é recorrente em seleções para residência médica e concursos. Confira um exemplo prático:
Prova: HEJSN – 2024 – Residência (acesso direto)
Paciente masculino, 1 ano, com dor no cotovelo ao acordar, sem trauma. Histórico de hematomas desde os 6 meses. Exame físico com limitação de movimento e hematomas nos membros inferiores. Exames laboratoriais: hemoglobina 11,7g; plaquetas 150 mil; rTTPA: 2,1; TP: 90%. Teste de mistura normalizou rTTPA.
Qual o próximo passo para investigação diagnóstica?
A) Dosagem de fator VIII e IX
B) Pesquisa de anticoagulante lúpico
C) Teste de agregação plaquetária
D) Mielograma
✅ Resposta correta: A
Referências
-
Leung, L.K. Overview of hemostasis. UpToDate, 2024.
-
Cagnolati, D. et al. Hemostasia e distúrbios da coagulação. Ribeirão Preto: FMRP-USP.
-
Hoffbrand, A.V.; Moss, P.A.H. Fundamentos em hematologia de Hoffbrand. 7ª ed. Artmed, 2018.
-
Kikuta, L.P.B. Hemostasia e seus principais testes laboratoriais. 2011.
